Forração ideal para gerbil: mitos e novas tendências

Forração ideal para gerbil: mitos e novas tendências
 (Texto de: Raquel Haddad Pereira, em 13/07/2017)

Se você adquiriu recentemente um gerbil e buscou na internet dicas e informações a respeito da criação deste animalzinho lindo, certamente já se deparou com o alerta vermelho: jamais utilize serragem (maravalha) de pinus para os gerbis, pois, teoricamente, esse material conteria substâncias que, ao entrar em contato com a urina, seriam extremamente tóxicas para o gerbil. Paralelo a isso, geralmente, sugere-se o uso da areia de gato de argila (a de sílica está realmente fora de cogitação), como uma forração supostamente segura para esses animais. Exporei aqui o meu longo processo de investigação, e posterior pesquisa, para verificar a veracidade destas informações, e já adianto: tratam-se de informações falsas. A maravalha de pinus, apesar de não ser extremamente tóxica, também não costuma ser indicada devido aos problemas respiratórios que a aspiração de seu pó pode causar. Paralelamente, a areia de gato à base de argila pode ocasionar a morte do animal, causando obstrução no mesmo caso seja ingerida. As opções seguras são as areias à base de cereais, que não apresentam risco quando ingeridas, assim como o papel toalha, feno e a palha de arroz.


A história da minha investigação

Durante o primeiro ano da minha criação eu segui fielmente estas dicas, acreditando tratar-se de uma verdade cientificamente comprovada, já que é tão amplamente divulgada nos diversos meios virtuais que tratam de gerbis. Porém, eu não entendia a secreção vermelha que insistia em sair do nariz dos meus bichinhos intermitentemente, provavelmente tratando-se de alergia. Assim, seguindo novas dicas, passei a peneirar a areia de gato antes de colocá-la na gaiola. Os problemas diminuíram, mas não desapareceram. Em determinado momento, alguns problemas maiores surgiram, e eu precisei levar um dos meus gerbis a um veterinário especializado em animais silvestres, o Dr. André S. M., que atende na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro.
Para minha surpresa, ao ouvir que eu utilizava areia de gato de argila como forração para o gerbil, o veterinário demonstrou estranheza. E eu, crente que estava super informada a este respeito, cheguei a duvidar da capacidade profissional deste veterinário, apesar de ele ser um profissional muito antigo, experiente e renomado na área. Bom, de qualquer forma, acreditei se tratar de um problema pontual, já que segui as demais dicas que ele me deu e obtive sucesso na melhoria da saúde do meu bichinho, que havia apresentado uma infecção ocular.
Algum tempo passado, duas gerbis minhas brigaram, e uma delas aparentou ter quebrado o rabo. E então, precisei novamente consultar um veterinário. Desta vez, eu optei por procurar outro profissional, para ter uma maior variedade de opiniões profissionais a respeito da criação do gerbil. O outro veterinário especializado em animais exóticos que eu consultei foi o Dr. Mauricio C., que atende em Niteroi, e tem mestrado pela UFF (Universidade Federal Fluminense). Este veterinário, por sua vez, me disse que não indicava o uso da areia de gato de argila para roedores, principalmente porque já se deparou com diversos casos de alergia à mesma. Sendo o segundo veterinário especialista a me dizer isso, eu comecei a duvidar da veracidade das informações tão insistentemente divulgadas nos meios virtuais de comunicação.
Nesse momento, decidi trocar a forração, e passei a comprar a PipiWC para experimentar, por se tratar de uma forração confirmadamente segura, de acordo com os profissionais. Com essa mudança, porém, o pêlo dos meus gerbis passou a apresentar um aspecto mais oleoso, já que eles não estavam mais mergulhados no pó da argila permanentemente. Assim, eu voltei a misturar um pouco da areia de gato de argila à PipiWC, e isso pareceu resolver o problema da oleosidade.
Infelizmente, algum tempo após essa mudança, a primeira gerbil que eu tive, dona de todos os filhotinhos que nasceram aqui, ficou, inicialmente, mais quietinha, e depois, fria, mole, apática... E faleceu, de um dia para o outro. Eu cheguei a levá-la ao veterinário no dia anterior ao falecimento. Ele ouviu o pulmão dela e disse que não acreditava tratar-se de um resfriado, pois na ausculta o pulmão parecia normal. Por isso, ele suspeitou de alguma infecção interna, e receitou um antibiótico e diversas vitaminas líquidas, para tentar reanimá-la. Eu cheguei a dar duas doses dos remédios antes do falecimento dela. Fiquei muito triste; e o pior, não vou jamais saber a causa do falecimento. Este veterinário também é especialista em animais exóticos, e atende em uma clínica 24h, na Tijuca. Eu cheguei a comentar algo com ele sobre a forração, mas estava tão preocupada com a saúde da minha Penélope que não me recordo muito bem do que foi dito. Apenas, tenho a impressão de que ele também não achou ideal a opção pela areia de gato de argila.
Como se não bastasse a maré de azar, novamente, duas fêmeas minhas brigaram. Na realidade, a tia atacou brutalmente a sobrinha. Eu não estava em casa, e quando cheguei e pude separá-las, a minha pequena já estava bastante machucada. Assim, fui novamente à busca de outro veterinário. O último que eu havia consultado em Niteroi não podia atender emergencialmente, e eu tive que procurar mais uma profissional com esta disponibilidade. Por sorte, encontrei a Dra. Brenda S. na Pet Clinic Icaraí, que foi muito atenciosa e cuidou muito bem da minha menina tão ferida. Além disso, ela também me tirou diversas dúvidas sobre a criação. Em relação à areia de gato de argila como forração, ela disse que não seria uma boa opção, pois a argila poderia causar obstrução nos gerbis, caso ingerida, uma vez que se torna uma massa quando umedecida. Essa possibilidade foi, posteriormente, confirmada por outra veterinária de exóticos que eu encontrei em um destes grupos de gerbil. Ela relatou já ter pego quatro casos de obstrução por areia de gato de argila em gerbis. Isso me fez pensar... E se a causa da morte da minha gerbil foi obstrução por areia de gato? Eu nunca saberei ao certo, mas é uma possibilidade.




Juntando as informações sobre a forração

A respeito da serragem de pinus, eu obtive a mesma resposta de todos os veterinários especialistas em animais exóticos que consultei: o principal problema que ela pode causar é respiratório, principalmente devido à enorme quantidade de pó que ela apresenta. Além disso, muitos animais também podem apresentar alergia a esta forração. Porém, uma vez confirmado que o seu gerbil não tem alergia a ela, basta apenas peneirá-la para retirar o excesso de pó.
Em relação à toxicidade do pinus, os veterinários que eu consultei revelaram tratar-se de algo falso. O pinus, por si só, não é tóxico para os gerbis. Quando em contato com a urina, libera fenois, que em altas quantidades podem ser tóxicos, assim como a própria urina apresenta substâncias tóxicas. Por isso, é muito importante que o terrário do gerbil seja bastante ventilado, para a dispersão destas substâncias; e que a troca da forração ocorra com frequência, para diminuir a exposição dos animais a estas substâncias presentes nos próprios excretas dos mesmos, como a amônia. Além disso, a troca frequente da forração dificulta a proliferação de fungos e outros problemas que podem surgir devido à umidade excessiva. Portanto, uma serragem de pinus de boa qualidade (a de má qualidade pode conter misturas nocivas), previamente peneirada, trocada com frequência, e em um terrário ventilado, não apresenta riscos para a saúde do seu animal. Vale lembrar que isso é sobre a maravalha de pinus. A de cedro é realmente perigosa para a saúde dos gerbis. Por isso, a importância de sempre comprar a maravalha de uma marca de boa qualidade.
Da mesma forma, a areia de gato, também peneirada, trocada com frequência (para não reter a umidade do ambiente), acompanhada de uma alimentação rica, equilibrada e balanceada (para o animal não vir a ingerir a argila), e com um terrário que possua a disponibilidade de muitos atrativos e distrações para o gerbil (novamente, para ele não ingerir a argila), também pode não apresentar riscos para a saúde do animal. Na realidade, a questão principal é muito mais a postura do criador e o seu comprometimento com a criação, que interferirão na saúde do seu bichinho.
O material de forração indicado com segurança pela maioria dos veterinários no Brasil é o papel toalha, trocado diariamente. Para criações maiores, porém, a troca diária torna-se inviável. Nesse sentido, também são opções seguras (desde que o seu animal não apresente alergia a elas):
- PipiWC: cama de celulose;
- LimpiCat: areia de gato à base de trigo;
- Xilapet: granulado sanitário à base de milho;
- Outras marcas de areia de gato à base de cereais, como Hello Kitty, Garfield, Ecocatix, etc;
- Feno (algum confiável, para não correr risco de estar contaminado);

- Palha de arroz.




            A maioria das forrações indicadas em sites estrangeiros sobre gerbil não existem aqui no Brasil, ou têm um valor absurdo pela importação. De qualquer forma, o que percebemos é que lá eles costumam encher o terrário quase inteiro com a forração, deixando bastante espaço para o gerbil cavar. Isso faz muito sentido, já que o gerbil é originalmente um animal do deserto, e vive boa parte da vida em túneis que eles cavam embaixo da terra. Por isso, há também o hábito instintivo deles de cavar insistentemente, até mesmo nos cantos da gaiola.
Nesse sentido, o ideal seria tentarmos reproduzir essa grossa camada de forração que eles proporcionam para os gerbis em outros países. Eu, particularmente, tenho feito isso com o feno. Coloco uma grossa camada de feno, e vou repondo à medida que eles comem ou roem. Abaixo da camada de feno, tenho colocado a Xilapet, para a absorção da urina. A respeito da Xilapet, eu não tive a oportunidade de pedir a opinião de veterinários, porém, me pareceu muito semelhante à Corn Cob, granulado de milho, amplamente utilizada em outros países. Outros materiais que eles utilizam bastante e com segurança lá fora são Aspen e Carefresh.

A pesquisa: o pinus é realmente tóxico?

            Certo. Obtive muitas informações por diversos veterinários. Mas então, POR QUE DIABOS se divulgam tão insistentemente essas informações falsas nos meios virtuais de comunicação sobre o gerbil? Buscando a origem destas informações, encontrei alguns sites norte-americanos, como The American Gerbil Society, que afirmam categoricamente que não se deve JAMAIS utilizar a forração de pinus ou cedro para os gerbis, por serem supostamente muito tóxicos aos mesmos. Este site, porém, assim como os demais sites que fazem essa afirmação, não apresentam nenhum dado de pesquisas científicas que comprovem estas informações. Eles apenas colocam que “há evidências de que o pinus é tóxico para os gerbis”, mas não colocam a fonte científica de onde tiraram essa informação.
            Por outro lado, há, igualmente, outros inúmeros sites que buscam refutar o mito de que o pinus faz um enorme mal para os roedores, e estes sim, embasam a sua explicação em diversas pesquisas e artigos científicos.
            A explicação de como este boato surgiu é dada pelo site Raising Rabbits:

One reason only - animal research scientists have had problems with standardizing the controls in pharmacological studies between various laboratories. (Tradução: Uma única razão – cientistas de pesquisa animal tiveram problemas para padronizar os controles em estudos farmacêuticos entre vários laboratórios.).

De fato, pesquisas revelam algumas pequenas alterações no metabolismo das enzimas do fígado de roedores em contato com o pinus. Estas mudanças, porém, são tão singelas que não seriam suficientes para causar problemas de saúde. Para o monitoramento de pesquisas científicas, porém, essa alteração poderia afetar os resultados do estudo. Assim, como exposto no site acima, essas pesquisas surgiram para justificar diferenças nos resultados obtidos entre diversos estudos realizados com ratos. Também serviram como justificativa para as grandes variações diárias que se tornaram um obstáculo no monitoramento de estudos científicos com drogas. Desse modo, as variações entre os resultados das diversas pesquisas puderam ser justificadas devido aos diferentes materiais de forração utilizados em cada laboratório.  Porém, mais uma vez, trata-se de uma alteração relevante apenas para fins de controle científico de pesquisas.
Os cientistas não desaconselham o uso da maravalha de pinus para roedores, eles apenas sugerem que, para fins de pesquisa científica, esta seja evitada, por motivos de padronização. E mesmo assim, o pinus somente não é indicado quando as pesquisas envolvem estudos de metabolismo de algumas drogas específicas, pois nem mesmo para pesquisas no geral essa alteração seria relevante.
E é isto que os diversos artigos posteriores, que irei explorar aqui, evidenciam. Inclusive, encontrei uma pesquisa bastante recente, de 2003. O boato exagerado, porém, foi aceito por alguns sites norte-americanos sobre gerbis, e foi sendo passado adiante, inclusive aqui no Brasil. Na verdade, o que ocorreu foi uma interpretação errônea do que as pesquisas científicas de fato demonstraram.
Para explorar melhor essa questão, cito aqui, o site Australian Rodent Club, com a matéria The Truth About Pine Shavings (Tradução: A verdade sobre a maravalha de pinus), que contem um artigo escrito por Corinne Fayo, publicado em diversas revistas científicas entre 1997-98. Como explicado no site, o artigo foi revisado e aprovado por Carol Green, pós-doutora em Farmacologia e Toxicologia, que possui mais de 80 publicações no campo. As traduções são minhas, e são aproximadas. O link do site estará abaixo para quem quiser ler, aqui irei apenas resumir algumas das informações que ele nos passa.

If all the phenols do is to induce some of the microsomal enzymes, that’s nothing to be concerned about. (Tradução: Se tudo o que os fenois fazem é induzir a produção de algumas enzimas, não há nada para se preocupar.).

            Neste site, também se afirma que o erro foi decorrente de interpretações e deduções erradas dos resultados de algumas pesquisas científicas, como podemos ver no seguinte trecho:

The great pine/cedar debate has been raging on the internet for quite awhile and many people have been mislead about the use of softwood (pine and cedar) bedding for small animals. Many people have been spreading incorrect, inaccurate information and have misinterpreted several scientific studies. Actually reading the studies and correctly interpreting them reveal there isn’t a danger in using softwood bedding for animals. After reading this article you will learn that treated shavings are safe and even recommended by veterinarians, the effects untreated softwood beddings cause is not harmful to the animals, and the claims they cause problems such as liver disease, damage, or cancer are not correct.

(Tradução: O grande debate sobre pinus/cedro tem ecoado na internet por bastante tempo e muitas pessoas foram enganadas sobre o uso das madeiras macias (pinus e cedro) como forração para pequenos animais. Muitas pessoas têm espalhado informações incorretas e imprecisas, e têm interpretado errado diversos estudos científicos. Na verdade, lendo estes estudos e interpretando-os corretamente revela-se que não há perigo no uso da madeira macia como forração para animais. Depois de ler este artigo, você vai aprender que maravalhas tratadas são seguras e até recomendadas por veterinários, e os efeitos que as não-tratadas causam não são danosos para os animais, e as afirmações de que elas causam problemas como doenças no fígado, danos ou câncer não estão corretos.).

            Em outra parte, a autora chama a atenção para a quantidade de inúmeros outros fatores que podem também afetar o metabolismo das enzimas do fígado, além do contato com a forração de pinus ou cedro:

After reading the studies which are most often quoted as providing evidence untreated shavings are harmful I must state I don’t see where any demonstrate a danger. What I have learned from the studies about HME is that there are many factors which can affect this sensitive system and cause an increase or decrease in activity. This is a partial list from one study: air exchange and composition, barometric pressure, cage design, cedar and other softwood bedding, cleanliness, coprophagia, diet, gravity, handling, humidity, light cycle, noise level, temperature, age, cardiovascular function, castration and hormone replacement, […]. “Dirty environments should now be added to the growing list of factors that affect the extremely sensitive hepatic microsomal system for metabolizing drugs. Among others, these factors include, age; sex; strain; litter of origin; painful stimuli; ambient temperature; degree of crowding; time of day or season of drug administration; hormonal; nutritional; and physiological status; and type of bedding”.

(Tradução: Depois de ler os estudos que são mais frequentemente citados como evidências de que as maravalhas não tratadas são danosas para os animais eu devo dizer que não vejo onde eles demonstram esse perigo. O que eu li nos estudos sobre HME é que há muitos fatores que podem afetar esse sistema sensível e causar aumento ou diminuição de sua atividade. Essa é uma lista parcial de um dos estudos: mudança no ar e em sua composição, pressão barométrica, modelo da gaiola, forração de cedro ou outras madeiras macias, limpeza, cropofagia, dieta, gravidade, cuidado, umidade, ciclo de luz, volume de ruídos, temperatura, idade, função cardiovascular, castração e reposição hormonal [...]. “Ambientes sujos deverão agora ser adicionados à lista crescente de fatores que afetam o extremamente sensível sistema microssômico hepático para a metabolização de drogas. Além de outros, esses fatores incluem idade, sexo, estresse, ninhada de origem, estímulos de dor, temperatura ambiente, grau de aglomeração, horário do dia ou estação da administração da droga, hormônios, nutrição, estado fisiológico, e tipo de forração”).

            Bom, essas eram informações apresentadas nos sites, mas então eu fui buscar as pesquisas a este respeito no google acadêmico. Encontrei algumas. Primeiramente, cito um artigo cujo título é Decrease in Hepatic Drug-Metabolizing Enzyme Activities after Removal of Rats from Pine Bedding (Tradução: Diminuição nas atividades metabólicas enzimáticas após a remoção de ratos da forração de pinus), de 2003:



            Logo no resumo do artigo já fica esclarecido que o seu objetivo é um alerta exclusivo aos pesquisadores que utilizam animais de laboratório. Na conclusão do artigo, ele explica isso mais detalhadamente. Porém, aqui colocarei apenas a versão inicial resumida:

Researchers using laboratory animals should, therefore, be aware that it takes several weeks for enzyme activities to stabilize once animals are removed from the bedding. (Tradução: Pesquisadores utilizando animais de laboratório deveriam, portanto, estar cientes de que levam várias semanas para as atividades enzimáticas se estabilizarem uma vez que os animais são removidos da forração [de pinus].).
                                                                                              
            Na conclusão, o autor ainda revela que acredita que este foi o primeiro estudo a detalhar as mudanças enzimáticas ocorridas nos animais de laboratório após a sua remoção da forração de pinus. A estimativa é que demore cerca de 6 a 12 semanas para o quadro enzimático se estabilizar.
            Também encontrei outro artigo mais antigo, de 1988, falando a respeito dos problemas no pulmão que a inspiração do pó da madeira do pinus causa em operários que trabalham em fábricas que lidam com esse material: The toxicity of constituents of cedar and pine woods to pulmonary epithelium (Tradução: A toxicidade de constituintes da madeira de cedro e pinus para o epitélio pulmonar):


            Destaco aqui alguns trechos deste artigo:

It is unknown, however, how plicatic acid produces this effect or if it contributes to the chronic lung disease observed in cedar-mill workers. (Tradução: É desconhecido, porém, como o ácido plicatic produz esse efeito ou se isso contribui para doenças crônicas no pulmão observadas nos trabalhadores de fábricas de cedro.).
[...]
Direct toxicity to pulmonary epithelium has previously been demonstrated for other substances that produce similar lung diseases, e.g., ozone, cotton dusts, and respiratory viral infections, such as respiratory syncytial virus. (Tradução: A toxicidade direta para o epitélio pulmonar já foi previamente demonstrada para outras substâncias que produzem doenças pulmonares similares, e.g., ozônio, pó de algodão, e infecções virais, como o vírus respiratório syncytial.).
[…]
Finally, evidence is beginning to accumulate that wood-dust exposure in a number of industrial and non-industrial activities can cause acute and chronic lung disease. For example, asthma is observed in carpenters exposed to pine-wood dust and in susceptible individuals exposed to Christmas trees. (Tradução: Finalmente, evidências estão começando a se acumular de que a exposição ao pó de madeira em um número de atividades industriais e não-industriais pode causar doenças agudas e crônicas pulmonares. Por exemplo, a asma é observada em carpinteiros expostos ao pó da madeira de pinus e em indivíduos suscetíveis expostos a árvores de Natal.).

            Diante destes trechos, cheguei à conclusão de que o estudo constata o que já era óbvio: respirar pó de madeira faz mal para o pulmão, assim como respirar pó de qualquer coisa. Como o próprio artigo diz, já foram obtidos resultados similares em pesquisas com outras substâncias, até mesmo com pó de algodão. No estudo, não foi nem ao menos descoberto como se deram as alterações que eles encontraram nas células do epitélio pulmonar, e nem se isso efetivamente contribui para as doenças crônicas dos trabalhadores das fábricas. A pesquisa, portanto, acaba sendo bastante evasiva.
Lembrando também que este artigo já é antigo (1988) e não encontrei pesquisas mais recentes que elaborem melhor o que ele observa. O estudo mostra que a aspiração do pó e partículas do pinus pode provocar problemas nas células do sistema respiratório, devido à presença do ácido abiético. Por isso, em indústrias de madeira os trabalhadores hoje em dia precisam usar proteção durante o trabalho, evitando a inspiração do pó da serragem. Isso esclarece também a enorme importância de peneirá-la, caso utilizada.
Porém, não há informações acerca da quantidade do ácido abiético presente na serragem para roedores e em seu pó, o quanto desta poderia ser aspirada mesmo quando previamente peneirada, e se esta quantidade seria suficiente para provocar danos no animal. O estudo foi feito tendo o ácido abiético diretamente injetado nas células pulmonares de humanos e ratos. Em relação ao gerbil, não há estudos estimando se este ácido é aspirado pelo animal e a sua quantidade, quando possui a maravalha como substrato. Todavia, há muitas evidências de criadores que relatam utilizar este substrato por anos em suas criações, seguindo as devidas precauções, e possuem animais que vivem acima do tempo médio de vida dos gerbis (5-6 anos). Isto evidencia o que o artigo acima mencionou, que muitos animais e humanos não apresentam danos na exposição ao pinus.
Relacionando a última pesquisa citada com o que a veterinária Pamela M. me passou, parece que o ácido abiético presente no pinus tem um baixo grau de toxicidade para as células pulmonares. A pesquisa não consegue precisar qual é exatamente esse grau e nem quais animais serão afetados por isso, porque alguns são e outros não, variando segundo o organismo de cada um (assim como com os trabalhadores das indústrias de madeira). Parece que no caso dos gerbis essa toxicidade ainda é baixa, levando em conta que a expectativa de vida deles é pequena. Isso pode ser relevante para compreender a singela implicância do pinus na saúde dos animais, pois os trabalhadores precisam de muitos anos trabalhando na indústria para apresentar problemas pulmonares, tempo que a expectativa de vida dos gerbis não abarca. Porém, em contato com os gases também tóxicos liberados pela urina, esses malefícios podem se agravar se a serragem não for trocada com frequência.
Além disso, entrei em contato com a pesquisadora Patrícia S. L. V. que faz estudos e trabalha com gerbis em laboratório. Descobri seu nome como orientadora de um artigo presente no scielo acerca de gerbis, e o busquei no facebook. Ela é doutora em biologia celular e estrutural, e me disse que desconhece estudos que comprovem definitivamente a toxicidade da maravalha de pinus, e que inclusive utiliza este substrato nos alojamentos de seus animais.
Também encontrei mais um artigo interessante de ser mencionado, intitulado Danos causados por roedores em povoamentos de pinus e técnicas de redução de danos, que evidencia que alguns roedores, principalmente uma espécie de rato, possuem as florestas de pinus como habitat natural. No artigo, os roedores são considerados pragas na região, pois roem as madeiras de pinus e destroem a plantação. Se os animais roem a madeira e vivem imersos nos resquícios de pinus liberados, seria muito estranho que o pinus fosse extremamente tóxico para eles, pois se trata de seu habitat natural. Trecho do resumo deste artigo:

Com esse trabalho objetiva-se elucidar certos aspectos relacionados aos danos causados por roedores em povoamentos de pinus através de um levantamento dos roedores, identificação dos agentes causadores dos danos, avaliação da extensão e dos efeitos dos danos causados por esses roedores, análise da inserção dos povoamentos na paisagem para relacionar com o nível de ataque e testes com técnicas de redução de danos pela alteração do meio. Os danos são provocados na base de árvores de pinus, através de roedura e retirada da casca, ocasionando ferimento parcial ou total na circunferência do tronco.

Em suma, pode-se concluir que alguns componentes presentes na serragem de pinus parecem apresentar certo grau de toxicidade quando em contato direto com as células pulmonares, mas isso afeta apenas alguns animais e outros não. Isso se agrava quando unido à toxicidade dos gases presentes naturalmente na urina dos animais. Por isso, caso seja utilizada, a serragem deve ser previamente peneirada e trocada frequentemente para que esses gases sejam liberados do ambiente. Como uma veterinária me disse, a toxicidade é baixa e para chegar a afetar mesmo o organismo deles o ambiente precisaria estar muito sujo.
            Enfim, não vou me estender mais, acredito que já falei demais. Há ainda vários artigos sobre a temática do pinus, mas nenhum deles comprova efetivamente a sua alta toxicidade para os roedores. O problema é a inalação do pó da madeira, e por isso, a maravalha deve ser bastante peneirada antes de ser utilizada, além de ser de uma marca boa e de qualidade. Mesmo assim, muitos roedores também podem apresentar alergia a ela. Por isso, apesar de a serragem não ser uma forração extremamente tóxica para roedores, ela também não costuma ser muito indicada, assim como não o é a areia de gato de argila. Como já foi dito anteriormente, as forrações seguramente indicadas para os gerbis no Brasil são o papel toalha, as areias de gato à base de cereais, o feno e a palha de arroz.
           
Acrescento novamente esta imagem compilando as forrações mais seguras para o gerbil:



Espero ter ajudado! =*



Fontes e referências bibliográficas:

Decrease in Hepatic Drug-Metabolizing Enzyme Activities after Removal of Rats from Pine Bedding. Andrew Keith Davey, PhD, John Paul Fawcett, PhD, Soo Eng Lee, Kwok Kay Chan, and John C. Schofield, BVSc. In: Comparative Medicine. Vol 53, No 3. June 2003. Disponível em: http://scholar.googleusercontent.com/scholar?q=cache:o4Ji2XU6cB8J:scholar.google.com/+gerbil+pine+shavings&hl=pt-BR&as_sdt=0,5. Acesso em: 12/07/2017.

The toxicity of constituents of cedar and pine woods to pulmonary epithelium. Garrison H. Ayars, MD, Leonard C. Altman, MD, Charles E. Frazier, PhD, and Emil Y. Chi, PhD. 1988. Disponível em: http://www.jacionline.org/article/0091-6749(89)90073-0/pdf. Acesso em: 12/07/2017.

Danos causados por roedores em povoamentos de pinus e técnicas de redução de danos. Juares Andreiv. Dissertação de mestrado da UFP, Curitiba, 2002. Disponível em: https://acervodigital.ufpr.br/bitstream/handle/1884/25950/D%20-%20ANDREIV,%20JUARES.pdf?sequence=1&fbclid=IwAR0jPg52F9wnWgk0VJQwit8nduQASz3JFQo-6O1DTJT9qXDa4fes061bHQk. Acesso em: 04/06/2020.

Disponível em: http://australianrodentclub.com/?p=126. Acesso em: 12/07/2017.

Disponível em: http://www.raising-rabbits.com/pine-shavings.html. Acesso em: 12/07/2017.

Disponível em: http://www.thegerbils.com/maintenance2bedding.htm. Acesso em: 12/07/2017.

Disponível em: http://cavyrescue.co.uk/safe-and-healthy-bedding-for-rodents/. Acesso em: 12/07/2017.

Disponível em: http://australianrodentclub.com/?p=126. Acesso em: 12/07/2017.

Disponível em: http://agsgerbils.org/Learn/Gerbil_Care_Handbook/care.php. Acesso em: 12/07/2017.


Comentários

  1. Perfeito... Assim que se faz Raquel... Pesquisando e indo atrás de informações sérias e embasadas... Meus parabéns!

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  2. Adorei. Parabéns pela pesquisa e esclarecimentos !!!;

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  3. Ótimo artigo. Estou pesquisando para ver se posso ter uma dupla de gerbils em casa.

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  4. cara, e areia comum, dessas lavadas e vendidas em casas de material de construção? não seria uma boa forração, já que o gerbil gosta de cavar?

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